Nós nos conhecemos quando eu tinha 16 anos e ele tinha 14. Nosso romance, se é assim que posso chamar, começou assim como começam todas as historias frustradas de amores no século 21, pelo Tinder.
Se o Tinder tiver alguma outra função além de desgraçar vidas, por favor, me contem, pois até hoje só me serviu para isso mesmo.
Não que ele seja um retrocesso em minha vida, é que... bem, eu me apaixonei... E como todo mundo sabe, se apaixonar é a uma sensação deliciosa que pode ser comparada à um lento e dolorido chute nas bolas.
Não, não é que não tenha bons momentos... mas toda aquela insegurança de não saber se a pessoa sente o mesmo. A insegurança não saber se não vai ter algum empecilho no caminho que torne o relacionamento de vocês um drama digno de novela mexicana. O medo do beijo não ser bom. Ou o sexo ser uma droga. E se o sexo for uma droga? E não me venham com essa historia de que amor supera tudo. Todos sabemos que ele se esgota. E então, o que acontece?
Sem contar o medo do amor da outra pessoa se esgotar antes do seu. Aquela competição de quem não vai fazer o papel de idiota na historia. Enfim, não me digam que vocês gostam dessa sensação. Pois eu? Eu prefiro a morte. E preferi mesmo. Bom... havia preferido, mas não era por amor nem por sua falta.
Nós morávamos longe um do outro, uns 60 km mais ou menos. Então não ia rolar. Mas com o tempo, passamos a nos falar o dia todo e a conexão ia se criando. Tínhamos muito em comum, desde gosto musical à coleções de decepções amorosas. Mas creio que nossa principal união era a falta de alegria.
Passávamos a maior parte do tempo reclamando sobre como a vida era uma bosta e como éramos obrigados a sobreviver dia após dia sem reclamar, pois, como diziam os adultos, tínhamos um teto, podíamos estudar e não passávamos por dificuldades. Mas como todos sabem, adolescentes sempre acham uma razão para sofrer e reclamar. Se está tudo bem na sua vida, tu já olha para aquele boyzinho com cara de "vou desgraçar a sua vida" e diz "quero". Para que as coisas calmas não é mesmo? A gente veio nesse mundo para sofrer e queremos cumprir bem o nosso papel.

Maldito dedo podre que também unia a gente, ou bendito, não sei, precisávamos ter sobre o que reclamar.
Nessa clássica historia de desconhecidos que passam a se falar o dia todo, um dia aconteceu o que todo mundo esperava. Ele disse "eu gosto de você".
Passei alguns dias sem responder, mas respondi. Também gosto de você.
Mais alguns dias sem ele me responder e então ele surge do nada sugerindo que nos víssemos pessoalmente.
Ele, como sempre, mais decidido e independente que eu, decidiu que viria até mim.
Ele era lindo. E eu? bom, eu era mediano. Tinha medo de quando ele me visse pessoalmente não gostasse, ou simplesmente quisesse ser apenas amigo enquanto eu já estava imaginando um futuro juntos. Acho que todo mundo se sente assim. E vocês ainda são capazes de dizer que gostam de se sentir apaixonados?
Marcamos. Tive medo. Fugi. Sumi do mapa final de semana inteiro.
Como já era de se esperar, brigamos, brigamos feio. Ele me chamou das coisas piores que vocês pode chamar alguém, e como ele sabia meus pontos fracos, me deixou no chão. Me mandou ir à merda e me bloqueou em toda rede social qual ele podia. Eu nem fui atrás pois sabia que estava errado.
A vida seguiu. Pensava nele as vezes. Mas tinha novos relacionamentos meio boca e destrutivos para me preocupar.
Um dia, vejo ele como sugestão de amigo no facebook. Ele já havia esquecido tudo e voltamos a conversar.
- Eu já não gosto mais de você.
- Tudo bem...eu senti sua falta.
Parou de me responder. No dia seguinte, havia mensagem dele.
- A vida continua uma merda.
- Por aqui a mesma coisa...
Conversa vai, conversa vem, percebemos que ainda não tínhamos a vontade de viver que a maioria das pessoas parecia ter. Aquele ânimo de "vai tudo melhorar", mas todos nós sabemos que a tendência é apenas piorar. Estar morto ou vivo, tanto faz. Nosso desinteresse pela vida era bem evidente.
Como eu já era mais adulto e seguro, ou pelo menos fingia melhor, fui até a cidade dele. Ele não fugiu como eu fiz. Bebemos, fumamos maconha, transamos e foi ótimo. Uma das inseguranças já superadas.
Ele ainda alterado me diz:
- Eu te odeio, e odeio a minha vida também. Essa merda só piora a cada dia. Daqui 5 anos vou estar afundado em uma merda maior.
- Bom, eu não te odeio.
- Mas não me ama.
O silêncio.
- É uma droga isso de ser obrigado a continuar vivendo para descobrir que daqui 5 anos estaremos mais afundados na merda que hoje.
- Bom, não precisamos.
- Cala boca, você está bêbado.
- Exato, sóbrio nunca teríamos coragem. Você não quer estar aqui. Eu não quero estar aqui.
O silêncio retorna. Dizem que quando duas pessoas estão em silêncio e não se sentem constrangidas, elas já atingiram a intimidade. Eu não estava constrangido, estava pensando sobre isso. Eu nunca tive planos. Eu nunca tive nem vontade de ter planos. Eu estava respirando e mais nada. Não esperava que nada fosse melhorar. Ele me beija e diz:
- Vamos fazer parte do clube dos 27!
- Esperar até os 27? É muito tempo. Podemos formar o club dos 21 e 23.
Estávamos chapados então só conseguíamos rir dessas ideias.
- Isso nem sequer faz sentido.
- A vida toda não faz.
- Eu conheço um lugar alto por aqui. Vamos apenas sentir como é poder fazer. Não precisamos. Só quero saber que posso.
Chegamos. Era um prédio alto que estava em construção. E sem seguranças. Isso era basicamente um convite. Terminamos a garrafa de vinho. Fumamos o finalzinho do beck. Discutimos de como aquilo era uma loucura. Discutimos sobre onde estaríamos em 5 anos. A conclusão foi que não queríamos descobrir.
Talvez fosse apenas a bebida misturada com a maconha e a tristeza. Mas tudo fazia sentido naquele momento.
Ficamos deitados observando o céu. Ele disse que ainda me amava. Eu lhe disse que era a bebida. Brigamos. Também disse que lhe amava.
Sentamos na mureta do terraço. Nós estávamos decididos. Ok, pularíamos no 3.
3,2...1
Eu, como sempre, não tive coragem. Só ouvi uma voz caindo e gritando. Nem sei o que ele gritou, mas na minha cabeça foi.
- SEU COVARDE FILHO DA PUTA.
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Porra!!! Puta que pariu!!! Todos achariam que eu o empurrei. O que eu diria para a policia? Porra, eu deveria ter me matado, caralho.
Subo na mureta novamente. Agora vai! Não! Eu estava sóbrio. Eu não teria coragem. Vai se foder, como eu era cagão, porra.
Desci o mais rápido que eu pude, vi um carro parando perto de onde ele caiu, corri para o outro. Fui para a casa dele pois a chave estava na minha bolsa.
Estava eu no quarto dele sem saber o que fazer. Eu era culpado, eu o incentivei a isso. Como eu poderia viver com essa culpa?
Cadê o resto da bebida? O cigarro? Onde ele guardava os remédios? Eu precisava ficar chapada. Pelo menos essa noite eu não ia lidar com isso.
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